[ breviário de decomposição ]

sábado, 12 de abril de 2008


sondra locke como “mick kelly” na rara adaptação de “the heart is a lonely hunter”

J’ai fait tant de projet qui sont restés en l’air
J’ai fondé tant d’espoirs qui se sont envolés


na concha de azulejos do banheiro, nos vapores, tenho os contornos do rosto amolecidos no espelho acima da pia, frascos, perfumes, comprimidos, esguicho água com os dentes na imagem borrada no espelho e lembro 1996. ainda ontem eu tinha 20 anos blue e olhava os mesmos olhos de cor irritante. elis é meio chata eu pensei, mas gostei de escutar ela cantando golden slumbers enquanto rodava a banca de revistas do aeroporto. sempre que viajo para cidades litorâneas gosto de ver a aterrissagem nas terras que se parecem com as silhuetas de grandes preguiçosos répteis crocodilos meio banhados pelas águas verde escuras. que gosto mais de impressão que não distorça no magenta. gosto da repetição quando ela é freqüência. dos substantivos femininos muito embora os masculinos sejam mais fáceis. gosto mais do relógio analógico antigo arcaico, não por resistência ao novo, mas pela fascinação da física que estes necessariamente empregam. gosto mais das curvas. nos sons, nas urgências, nos apertos, nas fronteiras, na natureza. gosto das sobreposições, sucessões, evoluções. mas também dos declínios, das sonolências, dos envelhecimentos. gosto ainda de falar dessas coisas para as quais nem sempre há destinatários. estas conficções de sempre.

(*) texto do jornalista marco godim, publicado em 23.08.2007 no seu falecido blog instructions on how to leave a hotel room (era bom pra cachorro, mas foi pro beleléu).