Sobre fim e recomeço
Foi com imenso pesar que descobri há pouco que a revista e o site Primeira Leitura não existem mais. A revista deixou de ser editada, o site saiu do ar. E isso desde 19.06.2006. Trabalho incansável do jornalista Reinaldo Azevedo e sua equipe, formada por um time de primeira linha: Liliana Pinheiro, Lucia Boldrini, André Soliani, José Alan Dias, Renato Andrade, Daniela Dias, José Carlos Pegorim, Álvaro Fagundes, Silvana Melati Cintra, Ricardo Jansen Oliveira, Raul Fiuza, Carolina Sueiro, Neuza Tasca, Pedro Fernandes, Vinicius Oliveira, Thais Dutra, Caio Blinder, Eduardo Simantob, Fernando Eichenberg, Hugo Estenssoro, Michel Laub, Helio Ponciano, Raul Jungmann, Roberto Romano, Mario Vitor Santos, José Nêumanne, Roberto Frenkel... Gente, vocês deixarão saudades. O pior de tudo é que só soube disso agora, por acaso, quando tentavar ver o conteúdo on line daquele periódico. A home page estava (e está) indisponível, então fiquei fuçando no Google para ver o que havai acontecido. Alienação momentânea que atribuo ao processo que culminou na minha separação... Êta fasezinha difícil gente! Então transcrevo abaixo a carta de despedida do pessoa da redação da revista:
Sobre fim e recomeço
Por Reinaldo Azevedo e Rui Nogueira
Primeira Leitura, site e revista, encerra hoje a sua trajetória. Mas, como se dizia naqueles tempos em que a disputa política era coberta pelo véu diáfano (Eça!) da fantasia, “a luta continua”. Daqui sairão novos projetos porque seus profissionais levam consigo o muito que já tinham e o tanto que aprenderam. Cada uma das notáveis pessoas que fazem os dois veículos sai daqui mais sábia do que quando entrou. Por uma boa e simples razão: todos soubemos aprender com o trabalho do outro.
Despedidas têm sempre um ar insuportavelmente solene. Mais do que isso: uma vítima de plantão fica gritando o seu veneno autocomplacente, ressentido, amesquinhado: “Não souberam nos compreender!” Mentira! Fomos, sim, muito bem compreendidos ao longo deste tempo. Nada nos faltou, a não ser, obviamente, anúncios em número suficiente para que o projeto pudesse seguir adiante.
Ao longo dos anos, foram muitas as especulações sobre os objetivos da revista e suas vinculações com este ou com aquele partidos, notadamente o PSDB. Em outro ponto do debate, via-se na revista e no site a voz da “direita”, como se a palavra, por si mesma, já devesse provocar um susto. De forma serena, tranqüila — e quem trabalhou aqui sabe disso —, enfrentamos as vagas de maledicência, de desconfiança, de descrédito. Talvez tenha faltado advertir, então, os supostos beneficiários do nosso trabalho que, pisando nos astros distraídos, não teriam percebido a nossa importância para seus objetivos estratégicos. Isso, naturalmente, é uma ironia. A ironia sempre nos fez bem.
E conquistamos, não obstante a patrulha, milhares de leitores tão críticos como fiéis. O site Primeira Leitura chega ao fim com 2 milhões de page views por mês, o que faz dele, talvez, o mais visitado de política e economia do país fora dos grandes portais. A revista, com tiragem de 25 mil exemplares, sempre vendeu, entre assinaturas e bancas, de 70% a 80% do total, marca excelente, a indicar a necessidade de aumentar a tiragem se, para tanto, houvesse recursos. Mas não havia.
Não se espere, obviamente, um texto jubiloso, como que saído da pena de quem logra uma grande vitória e ergue a taça dos campeões morais. Isso é uma rematada besteira. Primeira Leitura seguiu o caminho que achou correto, ciente das dificuldades que ele implicava; fez as críticas que julgou necessárias, tendo claro que a adesão a uns dois ou três dos mitos postos para consumo público poderia facilitar a sua trajetória, mas recusou o cálice do adesismo e repudiou o discurso fácil que nivela os crimes políticos pelo mínimo múltiplo comum, o que é hoje do interesse de quem dá as cartas. Nunca se leu aqui: “O Brasil é assim há 500 anos”. Pela simples e óbvia evidência de que o Brasil não é assim há 500 anos.
Isso tudo revela, desde sempre, os responsáveis pelo que houve e pelo que há: nós! Reinaldo Azevedo e Rui Nogueira escolhemos esse caminho, e olhem que coisa: não seria o caso de recuar um só milímetro. Justamente porque não depende da boa vontade de estranhos para existir, Primeira Leitura fecha. Justamente porque nunca foi outra coisa que não um projeto jornalístico, Primeira Leitura chega ao fim. Justamente porque jamais esteve atrelada a um partido e sempre se financiou no mercado, Primeira Leitura escolhe fechar.
Seus textos já são registros históricos, tanto quanto se pode fazer história no jornalismo, que parece condenado a uma espécie de presente eterno, avesso à teoria política e à memória. Foi possível, durante um bom tempo, provar que se pode fazer de forma diferente. Se não estamos exatamente felizes com o fim da jornada, não quer dizer que não estejamos orgulhosos. Somos os únicos a fazer jornalismo como acreditamos que tem de ser feito? não! Há mais gente por aí.
A Edusp, a Imprensa Oficial e a Editora Unicamp acabam de lançar três volumes intitulados Bilac, O Jornalista, organizado pelo professor Antonio Dimas. Olavo Bilac foi, a um só tempo, um dos mais festejados e satanizados poetas ainda em vida. Sua obra jornalística havia sumido na voragem da crítica literária. Década depois, ressurge inteira, intensa, às vezes quase premonitória.
Assim se vai fazendo história. Bilac é uma boa prova de que nunca se é profeta em seu próprio tempo, em tempo real. Os jornalistas, em particular, ganhariam muito com a leitura dos livros, que são, obviamente, de interesse geral. Mas vejam só: cá estamos nós a dar dicas, a sugerir leituras, a propor caminhos. Essa é a nossa natureza.Agradecemos profundamente, e eles sabem o quanto!, aos profissionais que fizeram Primeira Leitura, site e revista, ser o que é.
Agradecemos profundamente aos leitores que sempre deixaram claro a importância que os veículos tinham em seu cotidiano e em sua formação — mesmo aqueles que verteram admiração em fel da recusa, sem nunca deixar de experimentar o bom veneno. Agradecemos aos anunciantes — nem tantos, é verdade — que confiaram no nosso trabalho e souberam distinguir a publicação de um anúncio do endosso à linha editorial do veículo que o abriga. Porque não é assim nas democracias.
Primeira Leitura conseguiu ter uma cara, um perfil, uma visão de mundo, uma inteireza, sem, no entanto, ser uma igreja de pensamento. Ao contrário: sua maior virtude sempre foi essa unidade na pluralidade das pessoas que faziam os dois veículos. Cada um de nós sai daqui para tocar os seus projetos como pessoas maiúsculas, movidas a paixão, não a chiliques insondáveis da chefia; mobilizadas pelo senso de dever, não pelo terror idiossincrático de “quem manda”; estimuladas pelo respeito intelectual, não por rituais farsescos de humilhação tão comuns em redações e quartéis.
Quando se encontrar no currículo de um profissional a informação de que trabalhou em Primeira Leitura, que se saiba: está ali uma pessoa comprometida com a qualidade. Ela ajudou a fazer o site de política e economia mais visitado do Brasil e a revista que muita gente boa considerava a melhor do país. Os dois veículos chegam ao fim inteiros. Para se multiplicar.
Liliana Pinheiro, Lucia Boldrini, André Soliani, José Alan Dias, Renato Andrade, Daniela Dias, José Carlos Pegorim, Álvaro Fagundes, Silvana Melati Cintra, Ricardo Jansen Oliveira, Raul Fiuza, Carolina Sueiro, Neuza Tasca, Pedro Fernandes, Vinicius Oliveira, Thais Dutra, Caio Blinder, Eduardo Simantob, Fernando Eichenberg, Hugo Estenssoro, Michel Laub, Helio Ponciano, Raul Jungmann, Roberto Romano, Mario Vitor Santos, José Nêumanne, Roberto Frenkel... A toda essa gente, muito obrigado! E agradecemos também a outros grandes profissionais que passaram por Primeira Leitura e ajudaram a fazer a sua história.
Os assinantes da revista receberão no endereço em que a revista é entregue regularmente uma correspondência com as devidas informações e instruções. O site permanecerá no ar por mais algum tempo para que os internautas interessados possam ter acesso a textos que estão no arquivo. Os e-mails dos profissionais de Primeira Leitura estão sendo redirecionados para os respectivos endereços pessoais.A gente se lê por aí.
PS: Reinaldo Azevedo terá, em breve, um blog. Textos seus podem ser lidos nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo.
19 de Junho de 2006
A propósito, não posso deixar de registrar que desde então o Reinaldo Azevedo está escrevendo periodicamente em seu blog. Para acessar, clique aqui. #
Sobre fim e recomeço
Por Reinaldo Azevedo e Rui Nogueira
Primeira Leitura, site e revista, encerra hoje a sua trajetória. Mas, como se dizia naqueles tempos em que a disputa política era coberta pelo véu diáfano (Eça!) da fantasia, “a luta continua”. Daqui sairão novos projetos porque seus profissionais levam consigo o muito que já tinham e o tanto que aprenderam. Cada uma das notáveis pessoas que fazem os dois veículos sai daqui mais sábia do que quando entrou. Por uma boa e simples razão: todos soubemos aprender com o trabalho do outro.
Despedidas têm sempre um ar insuportavelmente solene. Mais do que isso: uma vítima de plantão fica gritando o seu veneno autocomplacente, ressentido, amesquinhado: “Não souberam nos compreender!” Mentira! Fomos, sim, muito bem compreendidos ao longo deste tempo. Nada nos faltou, a não ser, obviamente, anúncios em número suficiente para que o projeto pudesse seguir adiante.
Ao longo dos anos, foram muitas as especulações sobre os objetivos da revista e suas vinculações com este ou com aquele partidos, notadamente o PSDB. Em outro ponto do debate, via-se na revista e no site a voz da “direita”, como se a palavra, por si mesma, já devesse provocar um susto. De forma serena, tranqüila — e quem trabalhou aqui sabe disso —, enfrentamos as vagas de maledicência, de desconfiança, de descrédito. Talvez tenha faltado advertir, então, os supostos beneficiários do nosso trabalho que, pisando nos astros distraídos, não teriam percebido a nossa importância para seus objetivos estratégicos. Isso, naturalmente, é uma ironia. A ironia sempre nos fez bem.
E conquistamos, não obstante a patrulha, milhares de leitores tão críticos como fiéis. O site Primeira Leitura chega ao fim com 2 milhões de page views por mês, o que faz dele, talvez, o mais visitado de política e economia do país fora dos grandes portais. A revista, com tiragem de 25 mil exemplares, sempre vendeu, entre assinaturas e bancas, de 70% a 80% do total, marca excelente, a indicar a necessidade de aumentar a tiragem se, para tanto, houvesse recursos. Mas não havia.
Não se espere, obviamente, um texto jubiloso, como que saído da pena de quem logra uma grande vitória e ergue a taça dos campeões morais. Isso é uma rematada besteira. Primeira Leitura seguiu o caminho que achou correto, ciente das dificuldades que ele implicava; fez as críticas que julgou necessárias, tendo claro que a adesão a uns dois ou três dos mitos postos para consumo público poderia facilitar a sua trajetória, mas recusou o cálice do adesismo e repudiou o discurso fácil que nivela os crimes políticos pelo mínimo múltiplo comum, o que é hoje do interesse de quem dá as cartas. Nunca se leu aqui: “O Brasil é assim há 500 anos”. Pela simples e óbvia evidência de que o Brasil não é assim há 500 anos.
Isso tudo revela, desde sempre, os responsáveis pelo que houve e pelo que há: nós! Reinaldo Azevedo e Rui Nogueira escolhemos esse caminho, e olhem que coisa: não seria o caso de recuar um só milímetro. Justamente porque não depende da boa vontade de estranhos para existir, Primeira Leitura fecha. Justamente porque nunca foi outra coisa que não um projeto jornalístico, Primeira Leitura chega ao fim. Justamente porque jamais esteve atrelada a um partido e sempre se financiou no mercado, Primeira Leitura escolhe fechar.
Seus textos já são registros históricos, tanto quanto se pode fazer história no jornalismo, que parece condenado a uma espécie de presente eterno, avesso à teoria política e à memória. Foi possível, durante um bom tempo, provar que se pode fazer de forma diferente. Se não estamos exatamente felizes com o fim da jornada, não quer dizer que não estejamos orgulhosos. Somos os únicos a fazer jornalismo como acreditamos que tem de ser feito? não! Há mais gente por aí.
A Edusp, a Imprensa Oficial e a Editora Unicamp acabam de lançar três volumes intitulados Bilac, O Jornalista, organizado pelo professor Antonio Dimas. Olavo Bilac foi, a um só tempo, um dos mais festejados e satanizados poetas ainda em vida. Sua obra jornalística havia sumido na voragem da crítica literária. Década depois, ressurge inteira, intensa, às vezes quase premonitória.
Assim se vai fazendo história. Bilac é uma boa prova de que nunca se é profeta em seu próprio tempo, em tempo real. Os jornalistas, em particular, ganhariam muito com a leitura dos livros, que são, obviamente, de interesse geral. Mas vejam só: cá estamos nós a dar dicas, a sugerir leituras, a propor caminhos. Essa é a nossa natureza.Agradecemos profundamente, e eles sabem o quanto!, aos profissionais que fizeram Primeira Leitura, site e revista, ser o que é.
Agradecemos profundamente aos leitores que sempre deixaram claro a importância que os veículos tinham em seu cotidiano e em sua formação — mesmo aqueles que verteram admiração em fel da recusa, sem nunca deixar de experimentar o bom veneno. Agradecemos aos anunciantes — nem tantos, é verdade — que confiaram no nosso trabalho e souberam distinguir a publicação de um anúncio do endosso à linha editorial do veículo que o abriga. Porque não é assim nas democracias.
Primeira Leitura conseguiu ter uma cara, um perfil, uma visão de mundo, uma inteireza, sem, no entanto, ser uma igreja de pensamento. Ao contrário: sua maior virtude sempre foi essa unidade na pluralidade das pessoas que faziam os dois veículos. Cada um de nós sai daqui para tocar os seus projetos como pessoas maiúsculas, movidas a paixão, não a chiliques insondáveis da chefia; mobilizadas pelo senso de dever, não pelo terror idiossincrático de “quem manda”; estimuladas pelo respeito intelectual, não por rituais farsescos de humilhação tão comuns em redações e quartéis.
Quando se encontrar no currículo de um profissional a informação de que trabalhou em Primeira Leitura, que se saiba: está ali uma pessoa comprometida com a qualidade. Ela ajudou a fazer o site de política e economia mais visitado do Brasil e a revista que muita gente boa considerava a melhor do país. Os dois veículos chegam ao fim inteiros. Para se multiplicar.
Liliana Pinheiro, Lucia Boldrini, André Soliani, José Alan Dias, Renato Andrade, Daniela Dias, José Carlos Pegorim, Álvaro Fagundes, Silvana Melati Cintra, Ricardo Jansen Oliveira, Raul Fiuza, Carolina Sueiro, Neuza Tasca, Pedro Fernandes, Vinicius Oliveira, Thais Dutra, Caio Blinder, Eduardo Simantob, Fernando Eichenberg, Hugo Estenssoro, Michel Laub, Helio Ponciano, Raul Jungmann, Roberto Romano, Mario Vitor Santos, José Nêumanne, Roberto Frenkel... A toda essa gente, muito obrigado! E agradecemos também a outros grandes profissionais que passaram por Primeira Leitura e ajudaram a fazer a sua história.
Os assinantes da revista receberão no endereço em que a revista é entregue regularmente uma correspondência com as devidas informações e instruções. O site permanecerá no ar por mais algum tempo para que os internautas interessados possam ter acesso a textos que estão no arquivo. Os e-mails dos profissionais de Primeira Leitura estão sendo redirecionados para os respectivos endereços pessoais.A gente se lê por aí.
PS: Reinaldo Azevedo terá, em breve, um blog. Textos seus podem ser lidos nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo.
19 de Junho de 2006
A propósito, não posso deixar de registrar que desde então o Reinaldo Azevedo está escrevendo periodicamente em seu blog. Para acessar, clique aqui. #
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